Para avaliar o tamanho do mercado de crédito para as pessoas físicas no Brasil realizei o seguinte exercício: comparei a massa salarial brasileira, com base na Pesquisa Mensal de Emprego (PME) do IBGE, com o crédito bancário para as pessoas físicas. Nesse caso, temos que nos lembrar que a PME refere-se às regiões metropolitanas de São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Porto Alegre, Salvador e Recife.
Antes de chegar ao ponto, vou começar com uma breve discussão sobre o mercado de trabalho no Brasil. A massa salarial de fevereiro de 2004, segundo a PME, estava na casa dos R$ 16 bilhões, quando, em janeiro último, atingiu R$ 31 bilhões. O problema com a comparação direta destes números é que há sazonalidade, isto é, o rendimento de janeiro é, na verdade, o de dezembro que é pago naquele mês. Como os dados de fevereiro de 2008 ainda não estavam disponíveis quando fiz esta análise, foi necessário realizar alguns ajustes que serão esclarecidos durante o texto.
Note que o crescimento da massa salarial, comparando os mesmos meses (vamos comparar novembro de 2004 com novembro de 2007) foi de 39%, saindo de R$ 18,7 bilhões (11/04), para R$ 26,1 bilhões (11/07). Perceba que há dois movimentos aí: o primeiro é o aumento no número de trabalhadores ocupados, que cresceu mais de 8% nesse período (de 19,7 para 21,4 milhões de trabalhadores), e do salário médio, que foi elevado em 29%, saindo de R$ 945,30 para R$ 1.220,90. A inflação no período, medida pelo IPC-A, foi de 14,8%.
Feito este esclarecimento, vamos ao crédito. Utilizando a base de dados do Banco Central e tomando o saldo total em aberto das operações com pessoas físicas, em 2004, na média, eram necessários menos de 6 meses de trabalho (desse grupo da PME) para liquidar todo o crédito para pessoas físicas, sem levar em conta a existência de juros. Vejamos bem, seis meses de trabalho sem nenhum gasto, exceto o pagamento de empréstimos. Este número cresceu para 7,36 meses em 2005, para 8,62 em 2006 e atingiu 9,57 meses em 2007. Isto significa que o volume de crédito está crescendo a uma taxa muito mais rápida do que a massa salarial brasileira (pelo menos nessas cidades).
Para termos uma dimensão dos números, o saldo total em aberto no mês de fevereiro 2008 era de R$ 250,7 bilhões, com um acréscimo de R$ 4,1 bilhões sobre o saldo de janeiro de 2008. Por outro lado, as novas concessões de crédito são da ordem de R$ 48,1 bilhões em fevereiro de 2008. Ora, se as novas concessões atingiram R$ 48,1 bi e o estoque de crédito cresceu no último mês de R$ 4,1 bilhões, tratando de forma agregada (quero deixar isso bem claro), seria o mesmo que dizer que R$ 44 bilhões dos créditos liberados foram utilizados para saldar dívidas (rolagem). De fato, a média de pagamentos mensais do saldo devedores gira em torno desses R$ 44 bilhões, no agregado.
Outra curiosidade da análise é a comparação da concessão líquida, no caso, estes R$ 4,1 bilhões que foram acrescidos ao saldo do crédito, com a massa salarial. Para realizar essa tarefa, utilizei apenas os meses de fevereiro a novembro, por conta dos motivos que mencionei anteriormente. Além disso, o acréscimo do saldo de crédito no mês de dezembro cai sensivelmente (às vezes fica até negativo). O resultado que podemos observar o seguinte: No ano de 2004, a relação acréscimo do saldo dividido pela massa salarial foi, na média destes dez meses, de 13%, isto é, o crédito líquido liberado estava na faixa de 13% da renda dos trabalhadores. Este número subiu em 2005 para 21%, mas caiu para 15% em 2006, voltando a subir para 19% em 2007.
Isso mostra, em conjunto com o fato de que agora são necessários 9,57 meses de renda, quando antes eram apenas 6, duas coisas: a primeira é que o crédito líquido está fazendo com que a massa de recursos disponíveis para o trabalhador cresça em torno de 19% mensalmente. Por outro lado, o volume das dívidas aumentou quase 60% (9,57 meses em vez de 6 meses) comparativamente ao salário da população.
A inadimplência (Perceba que o que chamo aqui de inadimplência é o percentual de operações em atraso de mais de noventa dias, com relação ao total das operações em aberto) em janeiro de 2004 estava em 7,42% do total de crédito concedido às pessoas físicas. Em janeiro de 2005, este número havia se reduzido para 6,09%. Em janeiro de 2006 o número começou a subir novamente, atingindo 6,93%. Em janeiro de 2007, o percentual do crédito em atraso por mais de 90 dias atingiu 7,46% e, em janeiro deste ano, reduziu para 7,08% (o mesmo resultado para o mês de fevereiro).
No que se refere à inadimplência, contudo, não podemos fazer uma avaliação eficiente porque, diante do que falei sobre o volume de crédito que é concedido e o que aumenta o saldo do crédito, podemos perceber que estamos em um momento em que é possível tomar emprestado em um banco para pagar a outro, a famosa “bicicleta”. Em um momento de restrição que venha a ser adotado pelos bancos, este número irá realmente aparecer.
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