Antes de comentar a decisão que o Superior Tribunal de Justiça (STJ) tomou com relação ao Cadastro de
Emitentes de Cheques sem Fundos – CCF, operado e mantido pelo Banco do Brasil, quero deixar claro que não darei minha opinião acerca da necessidade de informação prévia de registros. Não quero “poluir” a discussão agora com este detalhe.
A decisão que vou comentar diz respeito ao julgamento do Recurso Especial nº 1.354.590 – RS pelo STJ, que resultou na conclusão de que o Banco do Brasil, embora mantenha um cadastro de informações creditícias (o CCF), está isento de informar aos consumidores a inclusão de seus nomes quando da emissão de cheques sem fundos.
Só para trazer uma referência legal, o Código de Defesa do Consumidor trata do tema com clareza:
Art. 43. (…)
§ 2° A abertura de cadastro, ficha, registro e dados pessoais e de consumo deverá ser comunicada por escrito ao consumidor, quando não solicitada por ele.
(…)
§ 4° Os bancos de dados e cadastros relativos a consumidores, os serviços de proteção ao crédito e congêneres são considerados entidades de caráter público.
O relatório do Ministro Raul Araújo informa que tanto o Ministério Público quanto a Defensoria Pública da União posicionaram-se favoráveis à necessidade do Banco do Brasil informar aos consumidores o registro de seus nomes, conforme prevê a legislação. Vejamos os trechos das suas manifestações, transcritos do documento citado:
O Ministério Público Federal opina pelo provimento do recurso especial para a “adoção da tese jurídica favorável à inserção do Banco do Brasil S.A., como administrador do CCF, no rol daqueles que podem ser responsabilizados em danos morais pela ausência de comunicação ao consumidor de sua inserção em bancos de dados de proteção ao crédito”(nas fls. 227/246).
e
Admitida como amicus curiae (na fl. 251), a Defensoria Pública da União apresenta manifestação defendendo que, “uma vez demonstrado que o Banco opera legitimamente o cadastro de emitentes de cheques (CCF), detém controle sobre as inclusões e exclusões de registros e ainda aufere lucro com a negociação das informações, se mostra, desse modo, incontestável a sua responsabilidade pelo banco de dados e seu encargo pelo gerenciamento das informações” (nas fls. 259/275).
Todavia, o posicionamento de grande parte das decisões do STJ foi no sentido de que não compete ao Banco do Brasil a informação, mas ao banco que incluir o nome do cliente. Compete, inclusive, aos demais sistemas de cadastro, quando utilizarem a informação do CCF, informarem novamente ao consumidor esta inclusão nas suas bases de dados.
No que tange ao voto do Ministro, o que me incomoda um pouco é esse tipo de argumentação:
Deve-se, assim, afastar a equivocada comparação entre a função, de interesse
predominantemente privado, de um serviço de proteção ao crédito comercial, que opera recursos
privados de cada empresário ou sociedade empresária, sem risco sistêmico, e a função, de interesse
público relevante, desempenhada pelo operador do CCF, de proteção de todo o sistema financeiro,
que opera com recursos captados com a população (economia popular).
Um dos maiores cadastros de crédito “comercial” foi criado e mantido durante muitos anos com a finalidade de reduzir os riscos das instituições financeiras.
Ademais, dizer que a questão dos bancos é afeta à economia popular é um pouco demais, porque me atrevo a afirmar que na maioria dos países o sistema financeiro alberga mais recursos em volume de dinheiro de pessoas abastadas do que dos que podem ser classificados como “populares”.
Por outro lado, a decisão guarda certa coerência com a regulamentação de abertura de contas de depósito à vista. Só para registrar, a ficha-proposta de abertura de conta (ou o contrato) deve ter uma informação de que o nome do cliente será informado ao CCF em caso de emissão de cheque sem a provisão de fundos. Esta informação é requerida pelo artigo 2º da Resolução CMN 2025, de 24 de novembro de 1993. De certa maneira, é um aviso prévio, para o caso de violação do contrato de conta, com a emissão de um cheque para ser debitado onde não há dinheiro disponível, nem limite de cheque especial.
Finalmente, para os que se sentem prejudicados pela medida, restará uma discussão sobre a fundamentação legal para buscar a reparação pelos danos morais derivados da não informação da inclusão do nome do consumidor no cadastro. Por um lado, a Lei (CDC) diz que é junto ao mantenedor desse cadastro, no caso, o CCF, por outro, a jurisprudência (STJ), afirma que é a instituição financeira sacada (banco onde o consumidor tem conta e contra o qual emitiu o cheque).